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Holanda, 06/01/2007

 

- Holandeses querem transformar fezes em remédio
 
Especialistas da Universidade de Amsterdã, os holandeses Max Nieuwdorp e Josbert Keller discutiam os preparativos para a operação de um paciente com diarréia crônica, causada pela bactéria do tipo Clostridium Difficile, quando foram interrompidos por um colega norueguês, em visita ao Centro Médico Acadêmico (AMC, sigla holandesa) daquela Universidade.

Ao ouvir a conversa dos pesquisadores - então decididos a retirar do intestino a parte afetada pela doença - o visitante interveio e disse: "Em casos como este, ministramos uma dose de fezes e ponto final". A aplicação do método necessitaria apenas de material doado por pessoas em bom estado de saúde. As fezes, diluídas em água, seriam posteriormente injetadas no intestino grosso do paciente, explicou o norueguês, e ali a flora saudável faria 'o que tinha que fazer' - combater o agressor.

Para satisfação geral, o doente em questão, internado há dias, ficou completamente curado no prazo de uma semana. Como ele, outras três pessoas se restabeleceram do quadro, no ano passado, ao receberem o tratamento que, além de inusitado e pode revolucionar o mercado de remédios para o combate à um tipo muito agressivo do Clostridium Difficile(chamado de ribotipo 027 ), bactéria ultra-resistente a antibióticos. "Nossa meta é fazer com que empresas farmacêuticas transformem os princípios ativos das fezes num medicamento eficaz, em forma de cápsulas", disse Max Nieuwdorp a Terra Magazine.

Por hora, os holandeses se ocupam da investigação do método, primeiramente testado nos Estados Unidos, em 1958. Nesta fase inicial, ainda de acordo com Nieuwdorp, se fará uma comparação entre a efetividade do tratamento comum - com antibióticos - e este. "Esperamos que a eficácia do uso de fezes supere a dos antibióticos de modo expressivo". Para tanto, os cientistas precisam de doadores. "Vão ser de grande serventia", brincou.

A diarréia ocasionada pela bactéria Clostridium Difficile (CDAD, sigla da doença) tomou o aspecto de epidemia nos hospitais e asilos holandeses, bem como em hospitais americanos, canadenses e ingleses. De acordo com Miriam Sommer, médica e epidemiologista clínica gaúcha radicada na Holanda, idosos são mais suscetíveis à contaminação, sobretudo quando hospitalizados. A substituição de um antibiótico por outro também representa um fator de risco.

Nos hospitais europeus, a prática de manter três, quatro pacientes num mesmo quarto é bastante comum. "Se estes estudos apresentarem resultados satisfatórios, isto representará um divisor de água em vários níveis: medicamentos a preços mais acessíveis do que os de hoje,e um passo posterior ao tratamento da diarréia causada por outros agentes", disse ela, que formou-se em Epidemiologia Clínica pela Universidade Erasmus, da cidade de Roterdã.

Em muitos hospitais, pacientes dividem o mesmo banheiro, dormem em camas separadas por uma distância inferior à mínima recomendada (três pés) e sofrem as conseqüências de uma higienização precária ou efetuada por um numero deficiente de profissionais. "Na Suécia, por exemplo", continuou Miriam Sommer, "o risco de um paciente hospitalizado em tratamento com antibióticos contrair a doença é 37 vezes maior se comparado a um paciente comum ". Na Europa, o longo tempo de internação hospitalar, combinado com os outros fatores de risco já referidos, também favorece o avanço deste tipo de infecção.

Max Nieuwdorp e seu colega esperam que a novidade contribua para a redução da taxa de reincidência da CDAD, estimada entre 20% a 25% dos casos. A dificuldade em combater a doença, com antibióticos, está relacionada a este fator. Apesar da longa exposição aos medicamentos, doentes não conseguem eliminar a Clostridium Difficile de seus intestinos, em caráter definitivo.

A utilização de fezes doadas parece fazer o serviço completo, ao ajudar no restabelecimento do equilibro de bactérias endógenas na flora intestinal. Em 2006, a CDAD ganhou destaque no noticiário holandês, depois que três pessoas da cidade de Leiden, cidade que abriga uma das melhores universidades européias, terem morrido da infecção.

Fonte: Terra Magazine
Texto: Arnild Van de Velde



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